Wednesday, February 28, 2007

Auto-flagelo

De Lucimara Paiva

Quer pagar penitência? Não espere até o fim da vida para ir até o inferno. Entre em um ônibus. Se você não enlouquecer em pouco tempo, a experiência servirá para armazenamento de dados antropológicos, químicos e psicológicos.
Todo dia meu lado masoquista agüenta 5 horas de puro prazer. Ninguém mandou morar em Pirituba.
Começo a questionar os mais diversos pontos da capacidade humana.
Pergunto-me como tem gente que consegue feder às 7 da manhã. Além dos sovacos podres soltando fumaça verde, o cheiro de mau hálito é generalizado e, já dizia meu professor do cursinho, que todo gás, venenoso como esse ou não, preenche todo o local que o contém. Para desmaiar é um pulo. Alguém quer um Trident?
No caso de coletivos, as regras não têm exceção. A mistura de calor sufocante, chuva e mais gente que o lugar comporta, só pode ter um resultado: janelas fechadas e compartilhamento de vírus.
Lotado ou não, as pessoas têm a péssima mania de se aglomerar na porta de saída. Não feliz, o cobrador faz questão de se levantar, olhar para o fundo e gritar: “Ô gente, dá um passinho pra trás, por gentileza!”. Você quer o quê, filho da puta?! Quer que eu abra a parte de trás dessa jabiraca ou me pendure na janela? E avise esse motorista, irmão do Tinhoso, para pegar leve com o freio, porque não sou carga para ser ajeitada aos trancos.
Se você, criança “chechelenta”, vier com a cara amarela, nariz escorrendo misturando-se com o resto de salgadinho e se atrever a empestear tudo com cheiro de chulé, vou fazer questão de vomitar no pé da sua mãe inútil e igualmente porca, que fede a óleo de amêndoa.
É necessário comer frango cozido bem aqui?
Sou grande mas não sou apoio, e se resolver dormir encoste essa cabeça, que não serve para nada, na droga da janela e me deixe em paz. Se escorregar para cima de mim vai levar sopapo na orelha. Só não sei se vou agüentar ver sua baba escorrendo até o colo. Tremo de ódio quando um tarado louco, que não tem dinheiro para pagar uma puta, que pensa em comer a própria mãe e que foi molestado pelo padrasto na infância, resolve se divertir. Por mais espaço que tenha, o pervertido faz questão de ficar colado nas suas costas, fungando na sua nuca. Perdi as contas de quantas lapiseiras perdi enquanto tentava perfurar os olhos de alguns desses.
Se mais uma vez você, sem cerimônia, colocar o pau para fora das calças e tentar esfregá-lo na minha cara, vou chutar o suficiente para arrancar essa merda do meio das suas pernas e enfiar na tua goela, desgraçado.
Quando não é homem, é mulher. Sente-se em algum banco do corredor que aparece uma estúpida apoiando a “xana” no teu braço. Olha para mim como que dizendo para eu ser compreensiva, pois o ônibus está muito cheio, todo mundo está empurrando e que é muito mais seguro se jogar em cima de outra mulher do que deixar a própria bunda servir de parque de diversão. Seguro nada, ô doente. Tire essa coisa do meu ombro agora. Ai que nojo.
Sem contar os meus cinco celulares roubados, o cheiro de cachorro molhado, gente que vomita no meio do corredor, o trânsito, a mistura de perfumes, as vozes estridentes, a obrigação de sair de casa 3 horas antes do compromisso marcado, motoristas que acordam irritados e resolvem escolher os pontos em que vão parar, torcida organizada que transforma tudo em arquibancada, gente folgada que carrega a compra do mês e só consegue arranjar carona para ir para a Praia Grande no Carnaval e adolescentes descontrolados que gritam.
Nesse momento, tenho certeza que tem gente limitada perguntando porquê não compro um carro e paro de reclamar. Estou na mesma situação que a maioria. Sou uma publicitária iniciante que se escraviza por um salário ínfimo, mas isso não me dá o direito de transformar a vida dos outros num caos quando estou em locais públicos. Educação, bom senso, respeito e higiene nada têm a ver com classe social.

13 comments:

Suzana Marion said...

Olá,

é praticamente a história do "UM DIA DE FÚRIA", só que todo dia... me compadeço da sua dor.

Anonymous said...

hehehe
mtooo bom Xú...de boa...já passei por várias dessas, e com certeza...
aquele fdp lá da frente com tdo lotado...pedindo pra apertar mais..afff...rs

porra!!!...carga viva...vamos com calma né...rs

mtoo bom!...seria cômico se não fosse trágico né...kkkk

Anonymous said...

Oi Lu!

Isso aí, põe raaage nesse texto! É bom, dá mais veracidade e força!!

Fiquei com vontade de bater no motorista até...Nos aproveitadores então..... Só fiquei com pena do menino remelento!! hahah

Bjo!

Anonymous said...

Easy!! Easy!! hahahha..... Vc deve ter escrito esse texto durante um dos trajetos que fez...hahaha...

Anonymous said...

Lú, nunca me identifiquei tanto com um texto seu? hahahahahaha
Os adolescentes que não sabem conversar sem gritar conseguem me irritar profundamente. Sem contar as tiazinhas que parecem terem nascido para reclamar do trânsito, dos ônibus sempre lotados, da política... como se ficar reclamando no meio do caos fosse resolver alguma coisa.
aff

beijo
mandinha

Unknown said...

Hehehe, adorei Lú. Ainda mais que tudo isso passa por mim, mas passa bem longe de mim uahuahau.

Acerola das Neves said...

O ódio também aparece em forma de automóvel, não se esqueça... rsrsrsrsrs transito, radar, multa, ipva, seguro obrigatório, risco de assaltos, batidas, concertos... e a desgraça continua... talvez a melhor solução é ir pro interior, comprar um jeguinho e passear calmamente em meio aos matagais... hehehehe bjos, bom texto! Tiago Abad

Anonymous said...

Puta que paril!!! Está sensacional!!! Impagável!!!
Ficou bom mesmo!!!

Muito realista... deu para sentir o cheiro do ônibus!!!

Parabéns!!!

Bjão.

Anonymous said...

Multipliquem o cheiro, a má educação, a lotação e todo o resto por 5.

Resultado = Trem "francisco morato / luz".


OBS.: Sou irmão dela, uso trem e gosto de sucrilhos.

Unknown said...

Ô menina de futuro... adorei o texto Lu. Sou sua fã

Bjs

Anonymous said...

Lu....apoiadíssima.......malditos-mau-cheirosos-passageiros-de-ônibus. Compartilho sua revolta. beijo e belo texto.

Li de Oliveira said...

Affffffff nem me lembre... passo tb por todo dilema duas vezes ao dia... coisas da vida... o bom da historia é q o caminho sempre nos rende inspiração aos textos. Algo de positivo sempre tem q ter!!!
Beijosss.

Camila Fernandes said...

Quem não te conhece pessoalmente e não sabe que você é uma dama pensaria que está diante de uma fera ensandecida... rs!
Eu não tinha idéia dessa raiva toda, menina. Franqueza. Mas, também, egoísmo da minha parte achar que só eu despiroco dentro de ônibus...
"Você quer o quê, filho da puta?! Quer que eu abra a parte de trás dessa jabiraca ou me pendure na janela?"
Me mata de rir.
E a última frase não poderia ser mais verdadeira. Cereja sobre o bolo.
Beijão.